Aldeia das Broas
Hoje, vi o sol desaparecer no horizonte à mesma hora daquele dia em que lhe dissemos até já na caminhada que fazíamos pela serra, enquanto rezávamos o terço. Na altura demos mais importância à lua que estava prestes a nascer, lembram-se? Era dia de Perigeu, o maior dos últimos 18 anos. Contemplámos o seu brilho enquanto as irmãs abasteciam a viatura, depois de um dia tão cheio, numa aventura que ia então a meio.
Começou com um simples sim! Sem grandes expectativas, confesso.
Aldeia das Broas? Nunca ouvi falar... Lembro-me pensar no bom que ia ser, não ter nada com que me preocupar ou organizar. E no fim de contas, alguém perdeu tempo na preparação de algo daqueles dias?
Cedo chegámos à Ericeira. Não muito cedo partimos, após a oração, de carrinha para um lugar ermo. Um grupo qb composto maioritariamente por caras de Odivelas. À cabecilha, duas irmãs que nos guiaram com desafios retóricos. O plano estava definido nas suas mentes. Nós apenas o picotámos, mas como se fossemos nós a criar a obra, pela primeira vez.
Começámos no alcatrão, mas rapidamente passámos a trilhos de cabras. O objectivo era chegar à aldeia mencionada, no íntimo dos montes, ao mesmo tempo que falávamos da nossa intimidade com Deus à pessoa que ao acaso era o nosso par. Lembraste da primeira vez que sentiste o tocar de Deus? Um exercício profundo, que terminou nas margens do rio Lizandro.
Para a aldeia chegar, o rio terás de atravessar.
Ri-me com ironia, ao mesmo tempo que imaginava as irmãs a atravessarem aquele curso de água, que não era tão pequeno assim. Nunca os meus pensamentos se tornaram realidade tão depressa. Naquele instante, e descalça, uma das irmãs entra, água a dentro, em direcção à outra margem. Risos, gritos, alguma euforia. Apesar do tempo quente a água estava gelada. E como referi, o caudal ainda era significativo. Molhados, alguns mais que outros, mas felizes. Naquele momento ninguém pensou na poluição, nas doenças ou em constipações. Seguimos o exemplo, e fomos felizes.
Sentados na erva verde, ao mesmo tempo que secávamos o que se molhou, deliciámo-nos com um piquenique que nos deu energia para enfrentar aquilo que nos separava da aldeia: o isolamento. Um lugar parado no tempo há mais de 40 anos, mas onde encontrámos a primavera. Ruínas que conservam os suspiros adultos e os gritos das crianças que ali brincaram, e que se deixam lentamente consumir pela erva e pelas flores que a tomam como sua. Uma aldeia que já foi do homem e que agora é de quem nela vive.
Tempo para reflectir, para respirar, fotografar, cachar, enfim… Tempo para nós!
Já a tarde ia avançada quando nos reunimos no meio das ruínas de um dos antigos currais. E ali estávamos quando uma voz evocou um desejo: Uma fogueira, uns chouriços… E tão depressa como a irmã se fez ao rio, apareceram chouriços e pão. O empenho pela fogueira pertenceu a todos. E todos ficaram saciados.
Houve então que regressar, o tal pôr-do-sol, a meditação do terço, o Perigeu.
Na base, um jantar à nossa espera. E depois de jantar, o que fazer? Ericeira, Sábado à noite… E que tal se… E do se ao Let’s go!, foi outro estalar de dedos. No entretanto estávamos com as duas irmãs numa esplanada junto ao mar a “curtir a noite” à boa maneira.
O dia que havia começado cedo, tarde acabou. Mas nem por isso ficámos o Domingo a dormir. Frescos para abraçar mais um dia, começámos por participar na Eucaristia dominical mesmo junto à praia. Num dia ainda mais quente que o anterior, desejámos caminhar na areia, e assim foi. A manhã foi dedicada à introspecção, onde cada um escolheu o seu recanto naquela praia que decresceu com o subir da maré. Juntos caminhámos até um pontão construído pelo homem. Um pontão onde Jesus havia estado previamente, a acalmar o conhecido revolto mar da Ericeira. Rodeados de uma imensidão de água serena, ouvimos a Palavra e partilhámos mais um pouco de nós. Da partilha da palavra à partilha da refeição. Escolhemos tomar a última refeição ao ar livre. Só assim faria sentido terminar.
E no final do fim-de-semana, um enorme bem-estar. É incrível como coisas tão simples ganham tamanho valor por terem sido tão genuínas e espontâneas. Onde o cansaço se resume à nossa vontade auto-realizada, e o sorriso ao nosso bem-estar interior. Sempre com Cristo presente.
Ainda antes de voltarmos ao quotidiano e mergulharmos nas imensas actividades da nossa paróquia, houve tempo para um banho no mar da Ericeira, naquelas últimas horas do Inverno de 2011.
André Silva
Começou com um simples sim! Sem grandes expectativas, confesso.
Aldeia das Broas? Nunca ouvi falar... Lembro-me pensar no bom que ia ser, não ter nada com que me preocupar ou organizar. E no fim de contas, alguém perdeu tempo na preparação de algo daqueles dias?
Cedo chegámos à Ericeira. Não muito cedo partimos, após a oração, de carrinha para um lugar ermo. Um grupo qb composto maioritariamente por caras de Odivelas. À cabecilha, duas irmãs que nos guiaram com desafios retóricos. O plano estava definido nas suas mentes. Nós apenas o picotámos, mas como se fossemos nós a criar a obra, pela primeira vez.
Começámos no alcatrão, mas rapidamente passámos a trilhos de cabras. O objectivo era chegar à aldeia mencionada, no íntimo dos montes, ao mesmo tempo que falávamos da nossa intimidade com Deus à pessoa que ao acaso era o nosso par. Lembraste da primeira vez que sentiste o tocar de Deus? Um exercício profundo, que terminou nas margens do rio Lizandro.
Para a aldeia chegar, o rio terás de atravessar.
Ri-me com ironia, ao mesmo tempo que imaginava as irmãs a atravessarem aquele curso de água, que não era tão pequeno assim. Nunca os meus pensamentos se tornaram realidade tão depressa. Naquele instante, e descalça, uma das irmãs entra, água a dentro, em direcção à outra margem. Risos, gritos, alguma euforia. Apesar do tempo quente a água estava gelada. E como referi, o caudal ainda era significativo. Molhados, alguns mais que outros, mas felizes. Naquele momento ninguém pensou na poluição, nas doenças ou em constipações. Seguimos o exemplo, e fomos felizes.
Sentados na erva verde, ao mesmo tempo que secávamos o que se molhou, deliciámo-nos com um piquenique que nos deu energia para enfrentar aquilo que nos separava da aldeia: o isolamento. Um lugar parado no tempo há mais de 40 anos, mas onde encontrámos a primavera. Ruínas que conservam os suspiros adultos e os gritos das crianças que ali brincaram, e que se deixam lentamente consumir pela erva e pelas flores que a tomam como sua. Uma aldeia que já foi do homem e que agora é de quem nela vive.
Tempo para reflectir, para respirar, fotografar, cachar, enfim… Tempo para nós!
Já a tarde ia avançada quando nos reunimos no meio das ruínas de um dos antigos currais. E ali estávamos quando uma voz evocou um desejo: Uma fogueira, uns chouriços… E tão depressa como a irmã se fez ao rio, apareceram chouriços e pão. O empenho pela fogueira pertenceu a todos. E todos ficaram saciados.
Houve então que regressar, o tal pôr-do-sol, a meditação do terço, o Perigeu.
Na base, um jantar à nossa espera. E depois de jantar, o que fazer? Ericeira, Sábado à noite… E que tal se… E do se ao Let’s go!, foi outro estalar de dedos. No entretanto estávamos com as duas irmãs numa esplanada junto ao mar a “curtir a noite” à boa maneira.
O dia que havia começado cedo, tarde acabou. Mas nem por isso ficámos o Domingo a dormir. Frescos para abraçar mais um dia, começámos por participar na Eucaristia dominical mesmo junto à praia. Num dia ainda mais quente que o anterior, desejámos caminhar na areia, e assim foi. A manhã foi dedicada à introspecção, onde cada um escolheu o seu recanto naquela praia que decresceu com o subir da maré. Juntos caminhámos até um pontão construído pelo homem. Um pontão onde Jesus havia estado previamente, a acalmar o conhecido revolto mar da Ericeira. Rodeados de uma imensidão de água serena, ouvimos a Palavra e partilhámos mais um pouco de nós. Da partilha da palavra à partilha da refeição. Escolhemos tomar a última refeição ao ar livre. Só assim faria sentido terminar.
E no final do fim-de-semana, um enorme bem-estar. É incrível como coisas tão simples ganham tamanho valor por terem sido tão genuínas e espontâneas. Onde o cansaço se resume à nossa vontade auto-realizada, e o sorriso ao nosso bem-estar interior. Sempre com Cristo presente.
Ainda antes de voltarmos ao quotidiano e mergulharmos nas imensas actividades da nossa paróquia, houve tempo para um banho no mar da Ericeira, naquelas últimas horas do Inverno de 2011.
André Silva